Maioria das cidades baianas não tem infraestrutura para atender o turista durante os festejos juninos
Considerada a maior festa popular do estado da Bahia, o período junino movimenta tradições, culturas e economias em praticamente todas as 417 cidades baianas. Um pouco mais dois meses do início das comemorações, que atraem visitantes de todas as regiões do Brasil e até do exterior, uma realidade pouco discutida começa a ganhar destaque: a falta de infraestrutura adequada para receber turistas na maioria dos municípios.
Enquanto as festas juninas se consolidam como um dos principais motores econômicos do interior baiano, a experiência de muitos visitantes está comprometida pela ausência de serviços básicos, especialmente no setor de hospedagem. Isto é, fora dos grandes centros urbanos – como Salvador, Feira de Santana e Vitória da Conquista –, a oferta de leitos e proteção é insuficiente para atender à demanda crescente gerada pelos festejos.
Déficit de hospedagem: um problema camuflado
Embora o governo estadual não disponibilize números oficiais sobre o déficit de hospedagem no interior, relatos de turistas revelam um cenário preocupante. Muitos viajantes enfrentam dificuldades para encontrar acomodações confortáveis, enquanto outros desistem de suas viagens por conta da falta de opções específicas.
Um exemplo emblemático ocorreu na região de Feira de Santana, município estratégico localizado às margens da BR-116. Um turista relatou que, durante sua estadia em uma cidade vizinha, durante estadia numa pousada local, foi obrigado a tomar café da manhã fora do estabelecimento, limitado a gastar apenas R$ 10 em uma padaria próxima. Situações como essa evidenciam não apenas a deficiência de escassez, mas também a baixa qualidade dos serviços oferecidos em algumas localidades.
Para driblar a falta de hotéis e pousadas, muitos turistas recorreram aos aluguéis por temporada, uma alternativa que tem ganhado força nos últimos anos. No entanto, essa solução nem sempre está disponível em cidades menores ou distritos mais distantes, onde a tecnologia e o acesso à internet ainda são desafios.
Festas tradicionais
Em busca de entender melhor a situação, municípios reconhecidos por suas festas juninas: Cachoeira, Cruz das Almas, Santo Antônio de Jesus, Amargosa, Jequié, Senhor do Bonfim, Lençóis, Mucugê e Piritiba, tem trabalhado na ampliação e qualificação do serviço, levando mais visitantes aos festejos.
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Cachoeira , conhecida por seu São João tradicional e pelas manifestações culturais como o samba de roda, recebe milhares de visitantes todos os anos. Apesar disso, a cidade enfrenta dificuldades para expandir sua rede hoteleira, equipamentos principalmente em pousadas familiares.
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Em Cruz das Almas , palco de uma das maiores festas juninas da Bahia, o fluxo intenso de turistas muitas vezes supera a capacidade de hospedagem local. Moradores relatam que muitos visitantes acabam optando por pernoitar em municípios vizinhos, quando poderiam investir na cidade e impacta diretamente na economia local.
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Já em Santo Antônio de Jesus, a infraestrutura urbana também é apontada como um gargalo. A proximidade de Salvador leva uma multidão a cidade, provocando também a limitação de hospedagem e aluguel por temporada, levando grande parte do público a se refugiar em cidades vizinhas.
Na Chapada Diamantina, Lençóis e Mucugê enfrentam desafios semelhantes. Embora essas cidades sejam destinos turísticos durante todo o ano, a alta demanda provocada por São João sobrecarrega pequenas pousadas e campings, deixando muitos turistas sem alternativas acessíveis.
Impacto econômico e oportunidades perdidas
A falta de infraestrutura não afeta apenas a experiência dos turistas, mas também prejudica o potencial econômico das festas juninas. Segundo especialistas, o turismo cultural e de eventos pode ser uma ferramenta poderosa para o desenvolvimento regional, desde que haja um planejamento adequado.
“O São João é uma oportunidade única para o interior baiano gerar renda e empregos, mas isso só acontece se os municípios investirem em infraestrutura básica”, afirma Maria Clara Santos, pesquisadora de turismo e cultura popular. “Sem leito suficiente, transporte eficiente e serviços de qualidade, o turista acaba indo embora frustrado, e o município perde a chance de se consolidar como destino turístico.”
Dados do Ministério do Turismo indicam que, em 2023, o turismo cultural representou cerca de 15% do total de receitas geradas pelo setor no Nordeste. Para especialistas, esse número poderia ser ainda maior se houvesse políticas públicas internas para o fortalecimento da infraestrutura em cidades de menor porte.
Perspectivas para o futuro
Diante desse cenário, lideranças locais e entidades do setor turístico defendem a necessidade de investimentos públicos e privados para melhorar a infraestrutura nos municípios. Entre as propostas estão:
- Criação de parcerias entre prefeituras e iniciativa privada para ampliar a oferta de hospedagem;
- Capacitação de moradores para atuar no setor de turismo, especialmente em áreas como hospitalidade e gastronomia;
- Modernização das plataformas de marketing digital para promover destinos menos conhecidos;
- Incentivos fiscais para empresários que desejam investir em hotéis e pousadas no interior.
Além disso, especialistas sugerem que as cidades aproveitarão o crescimento do turismo de base comunitário, modelo que valoriza a cultura local e gera renda diretamente para as comunidades.
Os festejos juninos são uma das expressões mais autênticas da cultura nordestina e representam uma oportunidade única para o desenvolvimento econômico do interior baiano. No entanto, a falta de infraestrutura adequada coloca em risco o potencial dessas celebrações. Para que o São João continue sendo um motor de transformação social e econômico, é fundamental que governos, empresários e comunidades trabalhem juntos para superar os desafios e garantir que o turista tenha uma experiência promissora – e que volte no próximo ano.